sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Henri Wallon



Militante apaixonado, o médico, psicólogo e filósofo francês mostrou que as crianças têm também corpo e emoções (e não apenas cabeça) na sala de aula


Nova-Escola
Foto: Wikimedia
Foto: Wallon levou não só o corpo da criança mas também suas emoções para dentro da sala de aula
Wallon levou não só o corpo da criança mas também suas emoções para dentro da sala de aula
Frases de Henri Wallon:

“A criança responde às impressões que as coisas lhe causam com gestos dirigidos a elas”

“O indivíduo é social não como resultado de circunstâncias externas, mas em virtude de uma necessidade interna” 

Henri Paul Hyacinthe Wallon nasceu em Paris, França, em 1879. Graduou-se em medicina e psicologia. Fez também filosofia. Atuou como médico na Primeira Guerra Mundial (1914-1918), ajudando a cuidar de pessoas com distúrbios psiquiátricos. Em 1925, criou um laboratório de psicologia biológica da criança. Quatro anos mais tarde, tornou-se professor da Universidade Sorbonne e vice-presidente do Grupo Francês de Educação Nova – instituição que ajudou a revolucionar o sistema de ensino daquele país e da qual foi presidente de 1946 até morrer, também em Paris, em 1962. Ao longo de toda a vida, dedicou-se a conhecer a infância e os caminhos da inteligência nas crianças.
Militante de esquerda, participou das forças de resistência contra
Adolf Hitler e foi perseguido pela Gestapo (a polícia política nazista) durante a Segunda Guerra (1939-1945). Em 1947, propôs mudanças estruturais no sistema educacional francês. Coordenou o projeto Reforma do Ensino, conhecido como Langevin-Wallon – conjunto de propostas equivalente à nossa Lei de Diretrizes e Bases. Nele, por exemplo, está escrito que nenhum aluno deve ser reprovado numa avaliação escolar. Em 1948, lançou a revista Enfance, que serviria de plataforma de novas idéias no mundo da educação – e que rapidamente se transformou numa espécie de bíblia para pesquisadores e professores.

Falar que a escola deve proporcionar formação integral (intelectual, afetiva e social) às crianças é comum hoje em dia. No início do século passado, porém, essa idéia foi uma verdadeira revolução no ensino. Uma revolução comandada por um médico, psicólogo e filósofo francês chamado Henri Wallon. Sua teoria pedagógica, que diz que o desenvolvimento intelectual envolve muito mais do que um simples cérebro, abalou as convicções numa época em que memória e erudição eram o máximo em termos de construção do conhecimento.

Wallon foi o primeiro a levar não só o corpo da criança mas também suas emoções para dentro da sala de aula. Fundamentou suas idéias em quatro elementos básicos que se comunicam o tempo todo: a afetividade, o movimento, a inteligência e a formação do eu como pessoa. Militante apaixonado (tanto na política como na educação), dizia que reprovar é sinônimo de expulsar, negar, excluir. Ou seja, “a própria negação do ensino”.

As emoções, para Wallon, têm papel preponderante no desenvolvimento da pessoa. É por meio delas que o aluno exterioriza seus desejos e suas vontades. Em geral são manifestações que expressam um universo importante e perceptível, mas pouco estimulado pelos modelos tradicionais de ensino.


Afetividade

As transformações fisiológicas em uma criança (ou, nas palavras de Wallon, em seu sistema neurovegetativo) revelam traços importantes de caráter e personalidade. “A emoção é altamente orgânica, altera a respiração, os batimentos cardíacos e até o tônus muscular, tem momentos de tensão e distensão que ajudam o ser humano a se conhecer”, explica Heloysa Dantas, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), estudiosa da obra de Wallon há 20 anos. Segundo ela, a raiva, a alegria, o medo, a tristeza e os sentimentos mais profundos ganham função relevante na relação da criança com o meio. “A emoção causa impacto no outro e tende a se propagar no meio social”, completa a pedagoga Izabel Galvão, também da USP. Ela diz que a afetividade é um dos principais elementos do desenvolvimento humano.

Movimento

Segundo a teoria de Wallon, as emoções dependem fundamentalmente da organização dos espaços para se manifestarem. A motricidade, portanto, tem caráter pedagógico tanto pela qualidade do gesto e do movimento quanto por sua representação. Por que, então, a disposição do espaço não pode ser diferente? Não é o caso de quebrar a rigidez e a imobilidade adaptando a sala de aula para que as crianças possam se movimentar mais? Mais que isso, que tipo de material é disponibilizado para os alunos numa atividade lúdica ou pedagógica? Conforme as idéias de Wallon, a escola infelizmente insiste em imobilizar a criança numa carteira, limitando justamente a fluidez das emoções e do pensamento, tão necessária para o desenvolvimento completo da pessoa.

Estudos realizados por Wallon com crianças entre 6 e 9 anos mostram que o desenvolvimento da inteligência depende essencialmente de como cada uma faz as diferenciações com a realidade exterior. Primeiro porque, ao mesmo tempo, suas idéias são lineares e se misturam – ocasionando um conflito permanente entre dois mundos, o interior, povoado de sonhos e fantasias, e o real, cheio de símbolos, códigos e valores sociais e culturais.

Nesse conflito entre situações antagônicas ganha sempre a criança. É na solução dos confrontos que a inteligência evolui. Wallon diz que o sincretismo (mistura de idéias num mesmo plano), bastante comum nessa fase, é fator determinante para o desenvolvimento intelectual. Daí se estabelece um ciclo constante de boas e novas descobertas.

O eu e o outro

A construção do eu na teoria de Wallon depende essencialmente do outro. Seja para ser referência, seja para ser negado. Principalmente a partir do instante em que a criança começa a viver a chamada crise de oposição, em que a negação do outro funciona como uma espécie de instrumento de descoberta de si própria. Isso se dá aos 3 anos de idade, a hora de saber que “eu” sou. “Manipulação (agredir ou se jogar no chão para alcançar o objetivo), sedução (fazer chantagem emocional com pais e professores) e imitação do outro são características comuns nessa fase”, diz a professora Angela Bretas, da Escola de Educação Física da Universidade Estadual do Rio de Janeiro. “Até mesmo a dor, o ódio e o sofrimento são elementos estimuladores da construção do eu”, emenda Heloysa Dantas. Isso justifica o espírito crítico da teoria walloniana aos modelos convencionais de educação.

Wallon na escola: humanizar a inteligência

Diferentemente dos métodos tradicionais (que priorizam a inteligência e o desempenho em sala de aula), a proposta walloniana põe o desenvolvimento intelectual dentro de uma cultura mais humanizada. A abordagem é sempre a de considerar a pessoa como um todo. Elementos como afetividade, emoções, movimento e espaço físico se encontram num mesmo plano. As atividades pedagógicas e os objetos, assim, devem ser trabalhados de formas variadas. Numa sala de leitura, por exemplo, a criança pode ficar sentada, deitada ou fazendo coreografias da história contada pelo professor. Os temas e as disciplinas não se restringem a trabalhar o conteúdo, mas a ajudar a descobrir o eu no outro. Essa relação dialética ajuda a desenvolver a criança em sintonia com o meio.

Para pensar

A teoria de Henri Wallon ainda é um desafio para muitos pais, escolas e professores. Sua obra faz uma resistência contumaz aos métodos pedagógicos tradicionais. Numa época de crises, guerras, separações e individualismos como a nossa, não seria melhor começar a pôr em prática nas escolas idéias mais humanistas, que valorizem desde cedo a importância das emoções?

Fonte:

Uma reflexão sobre o pensamento pedagógico de Henri Wallon

Henri Wallon (1872-1962) foi um estudioso que se dedicou ao entendimento do psiquismo humano, seus mecanismos e relações mútuas, a partir de uma perspectiva genética. Por isso seu interesse pelo desenvolvimento infantil, já que na infância se localiza a gênese da maior parte dos processos psíquicos.

Além disso, Wallon participou ativamente de debates em torno do tema Educação, contribuindo com críticas à educação tradicional. Dessa forma, podemos encontrar em sua obra interessantes posições, apesar de esse autor não ter proposto um método pedagógico.

Nesse texto, Izabel Galvão aponta as contribuições da obra de Wallon ao pensamento pedagógico, oferecendo subsídios para os educadores compreenderem e refletirem sobre sua relação com seus alunos e a organização do trabalho em sala de aula.



"O projeto de sua psicogenética (de Wallon) é o estudo da pessoa completa, considerada em suas relações com o meio (contextuada) e em seus diversos domínios (integrada). Contrário ao procedimento de se privilegiar um único aspecto do desenvolvimento da criança, WALLON o estuda em seus domínios afetivo, cognitivo e motor, procurando mostrar quais são, nos diferentes momentos do desenvolvimento, os vínculos entre cada um e suas implicações com o todo representado pela personalidade. Desta opção, resultam quatro temas centrais na sua teoria: emoção, movimento, inteligência, personalidade."

"A serviço da Educação, a psicogenética walloniana oferece subsídios para aprofundar a reflexão sobre a prática pedagógica, motivando a investigação educacional. Ao mesmo tempo, impõe exigências sobre esta prática, cobrando da Escola o atendimento do indivíduo na integridade dos domínios que o constituem (afetivo, cognitivo e motor)."

"Tendo acesso a material teórico que aborda de forma integrada, temas como expressividade, emoção, gestualidade, movimento, representação mental, pensamento discursivo, o professor estará provavelmente melhor preparado para atender a criança em suas diversas necessidades, assim como impulsionar o seu desenvolvimento e favorecer sua aprendizagem. Afinal, a Escola não deve dissociar a formação da inteligência da formação da personalidade, pois a inteligência tem ´status´ de parte no todo constituído pela pessoa e seu desenvolvimento está ligado ao das outras esferas constitutivas deste todo."

"Esta concepção valoriza o papel do professor. Como elemento diferenciado, é o responsável pela unidade do grupo, podendo receber as manifestações das crises infantis com o distanciamento necessário para não as comprimir nem se submeter a elas.(...) O professor é valorizado também do ponto de vista do conteúdo. Não se deve colocar como exclusivo detentor do saber e único responsável pela sua transmissão, mas tampouco abdicar deste papel, submetendo-se indiscriminadamente à espontaneidade infantil".



Fonte: http://www.crmariocovas.sp.gov.br/dea_a.php?t=009

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

A Pedagogia construtivista de Lev Vygotsky (1896-1934)

Lev Vygotsky nasceu, na Bielo-Rússia, em 1896. Depois de
receber aulas particulares de Solomon Ashpiz, frequentou e trabalhou
no Instituto de Psicologia de Moscovo, entre 1923 e 1934, onde teve
oportunidade de desenvolver as suas teorias sobre o
desenvolvimento cognitivo e a relação entre o pensamento e a
linguagem. Viria a morrer, aos 38 anos, de tuberculose. Deixou uma
obra vasta, composta por seis volumes (1), escritos ao longo de uma
carreira curta de apenas dez anos.
Desconhecido no Ocidente, a sua obra foi descoberta na década
de 60 do século passado, graças às primeiras traduções dos seus
livros. O impacto de Vygotsky nos meios educacionais ocidentais foi
tremendo e talvez só seja comparável à influência e popularidade de
Jean Piaget. Juntamente com Jean Piaget, Lawrence Kohlberg e Paulo
Freire, Lev Vygostky faz parte de uma galeria de grurus educacionais
com enorme aceitação nas escolas de educação e a sua obra
influenciou grandemente as políticas e orientações educativas, na
Europa Ocidental, nas últimas três décadas do século passado.
Curiosamente, o pensamento pedagógico de Lev Vygotsky nunca
conheceu tanta influência e popularidade na União Soviética, onde,
apesar da sua ortodoxia marxista, fora encarado, durante os regimes
de Staline, Krutchov e Brejnev, como um comunista da ala direita,
contaminado por um certo idealismo burguês. Provavelmente, a
morte prematura de Lev Vygotsky tê-lo-á poupado às purgas
estalinistas que conduziram à morte, por perseguição política, de
mais de 20 milhões de pessoas, de entre as quais muitos milhares
intelectuais tão fiéis ao marxismo e ao comunismo como Vygotsky
fora.
Embora, a teoria social da aprendizagem de Vygotsky não
introduza nada de radicalmente diferente em relação à teoria
construtivista de Jean Piaget, a sua popularidade nos meios
educacionais de esquerda só é comparável à influência de Paulo
Freire. Na verdade, tanto Vygotsky como Piaget partilham a visão
construtivista, assente na ideia de que a única aprendizagem
significativa é a que ocorre através da interacção entre o sujeito, o
objecto e outros sujeitos (colegas ou professores). As outras formas
de aprendizagem, como sejam a imitação, a observação, a
demonstração, a exemplificação e a prática dirigida são colocadas em
lugar secundário tanto por Piaget como por Vygotsky. O que
verdadeiramente distingue Vygotsky de Piaget é a descrença do
primeiro em relação a uma hierarquia de estádios do
desenvolvimento cognitivo tão estanque e determinista como a que
Piaget desenvolveu. Vygotsky, à semelhança do que mais tarde faria
Jerome Bruner, dá, igualmente, maior relevo aos contextos culturais
e ao papel da linguagem no processo de construção de conhecimento
e de desenvolvimento cognitivo. De resto, há muitas semelhanças.
Até mesmo a teoria da zona de desenvolvimento próximo, central na
teoria da aprendizagem do pedagogo soviético, não é muito diferente
das propostas de Piaget ou de Kohlberg sobre as tarefas
moderadamente discrepantes, ou seja, sobre o potencial educativo e
desenvolvimentista das tarefas de ensino que não sejam nem muito
difíceis nem muito fáceis para o aluno. Como é sabido, Piaget defende
que as tarefas devem provocar um desequilíbrio cognitivo moderado
que permita ao aluno passar por um processo de assimilação e de
acomodação que potencie o desenvolvimento dos esquemas mentais,
em direcção a uma nova equilibração e por aí adiante. A teoria da
zona de desenvolvimento próximo tem, de facto, grandes
semelhanças com a teoria da equilibração de Jean Piaget. A
aprendizagem mais significativa é que se baseia no processo de
construção do conhecimento por parte dos alunos. Esse processo de
construção é tanto melhor conduzido quanto melhor o professor for
capaz de criar ambientes de aprendizagem que potenciem a
interacção entre alunos em estádios cognitivos ligeiramente
diferentes ou em fases de transição de estádio.
Vygotsky defende que a criança aprende melhor quando é
confrontada com tarefas que impliquem um desafio cognitivo não
muito discrepante, ou seja, que se situem naquilo a que o psicólogo
soviético chama de zona de desenvolvimento próximo. Esta teoria
tem implicações importantes no processo de instrução: o professor
deve proporcionar aos alunos a oportunidade de aumentarem as suas
competências e conhecimento, partindo daquilo que eles já sabem,
levando-os a interagir com outros alunos em processos de
aprendizagem cooperativa.
Provavelmente, a maior originalidade da teoria de Vygotsky
reside na ênfase que ele dá ao papel dos contextos culturais e da
linguagem no processo de aprendizagem. Jerome Bruner desenvolveu
esta ideia e introduziu-a na proposta de currículo em espiral, o qual,
no fundo, é uma aplicação da teoria da zona de desenvolvimento
próximo.
Vygotsky enfatiza a ligação entre as pessoas e o contexto
cultural em que vivem e são educadas. De acordo com ele, as
pessoas usam instrumentos que vão buscar à cultura onde estão
imersas e entre esses instrumentos tem lugar de destaque a
linguagem, a qual é usada como mediação entre o sujeito e o
ambiente social. A internalização dessas competências e instrumentos
conduz à aquisição de competências de pensamento mais
desenvolvidas, constituindo o cerne do processo de desenvolvimento
cognitivo.

Fonte: http://www.eses.pt/usr/ramiro/docs/etica_pedagogia/A%20Pedagogia%20construtivista%20de%20Lev%20Vygotsky.pdf

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

A PEDAGOGIA DE PAULO FREIRE

Paulo Freire nasceu no Recife, Pernambuco, Brasil, em 1921. Embora tendo se
formado em Direito, logo descobriu sua vocaçao de Educador. Porém, nao um educador
formal, profissional, mas um educador para a liberdade. Sua primeira experiencia foi no
SESI – Serviço Social da Industria, onde trabalhou com familias operarias nos “Circulos
de Pais e Professores”; e experimentou o que ele mesmo chamou de “uma educaçao
social”. No SESI esteve por 10 anos, de 1947 a 1957. Esta foi a base concreta sobre a
qual Paulo Freire elaborou sua tese de doscencia para a cadeira de Historia e Filosofia
da Educaçao, na Escola de Belas Artes de Pernanbuco, defendida em 1959. Este
trabalho so seria publicado, muito mais tarde, em 2001, quatro anos apos sua morte, que
ocorreu em 1997, e se chamou: “Educaçao e Atualidade Brasileira”. Foi seu primeiro
trabalho de folego, denso, com reflexoes que seriam aprofundadas em suas obras
posteriores, entre elas: “Educaçao como pratica da liberdade”, “Açao Cultural para a
lliberdade” e “Pedagogia do oprimido”.
O periodo mais fertil da experiencia e reflexao de Paulo Freire se deu nos ultimos
anos da decada de 50 e inicio dos anos 60. Ai ele organizou o “Serviço de Extensao
Cultural” da Universidade Federal de Pernambuco e participou ativamente do Movimento
de Cultura Popular. Foi quando, junto com sua esposa Elza, que tambem era educadora,
e uma equipe de colaboradores, desenvolveu um metodo de alfabetizaçao que permitia o
aprendizado da leitura e da escrita em 45 dias. Este nao era um metodo abstrato de
aprendizagem, mas um jeito concreto de ensinar e aprender as palavras e o mundo. Uma
proposta pedagogica que promovia alfabetizaçao politica; o que significa muito mais do
que se apropriar dos codigos da leitura e da escrita. Uma pedagogia que, partindo da
realidade concreta e suas formas de interpretaçao, busca supera-las e construir um
conhecimento novo. Este conhecimento novo, ja nao e mais apenas o conhecimento
teorico do educador ou o conhecimento empirico do educando, mas algo diferente. Um
conhecimento que integra pratica e teoria, e desperta ambos os sujeitos do processo
educativo – educando e educador; dirigente e dirigido; liderança e base – para a luta de
transformaçao da realidade.
Portanto esta educaçao, é um ato politico que reeduca todos os sujeitos
envolvidos. È mais do que transmissao de conteudos. Envolve postura e atitude diante do
mundo e do OUTRO, que é diferente de mim. Nao é a teoria ou os conceitos abstratos
que educam. È a pratica concreta que, sendo pensada à luz da teoria, transforma a
realidade. Esta é a pedagogia de Paulo Freire – uma praxis transformadora das estruturas
e das pessoas. Ele mesmo dizia que nao era criador de um “método de alfabetizaçao ou
de conscientizaçao”, mas o que propunha era um conjunto de principios, de valores
pedagogicos “encharcados” de realidade. Nao é possivel estudar Paulo Freire, sem olhar
para nossa propria pratica. E isto é dolorido porque implica descobrir o opressor que
hospedamos dentro de nos mesmos. Signfica morrer, para nascer de novo. Um novo
homem e uma nova mulher, como dizia Che Guevara.
A pedagogia freireana é uma pedagogia radical, que propoe subverter a ordem
social vigente em todos os seus niveis: pessoal, micro e macroestrutural. Nao é uma
didatica, ou uma tatica politica. Ainda que um conjunto de tecnicas ou pequenas açoes,
como: o jeito de dispor as carteiras numa sala de aula, o debate em circulos, o jeito de
coordenar uma reuniao, a distribuiçao coletiva de tarefas, o estudo em pequenos grupos,
façam parte do exercicio democratico, do combate ao autoritarismo e, portanto, da
desconcentraçao de poder. Porque todas essas pequenas açoes restituem,
gradativamente, a palavra àquelas pessoas que, historicamente, aprenderam apenas a
ouvir e obedecer. Ajudam a construir autonomia com responsabilidade. Desafiam a
superar limites pessoais.
Neste sentido, embora tenha sido pensada a partir da realidade brasileira e
latinoamericana, a pedagogia freireana serve para qualquer lugar do mundo, onde
existam oprimidos e opressores. Para Paulo Freire, sua “teoria da açao dialogica”
pressupoe dois momentos fundamentais: o reconhecimento da desumanizaçao e o
angajamento em um processo de humanizaçao. Ou, dito de outra forma, pressupoe o
momento da denuncia e o momento do anuncio. Ambos construidos dialogicamente, num
processo de problematizaçao que relaciona os fenomenos entre si, com suas causas e
efeitos; o simples e o complexo; o local e o global. Numa especie de espiral que, unindo
teoria e pratica, permite compreender o funcionamento da sociedade, na medida em que
vai desvelando a realidade.
Em suas proprias palavras: “nao ha utopia verdadeira fora da tensao entre a
denuncia de um presente tornando-se cada vez mais intoleravel e o anuncio de um futuro
a ser criado, construido, politica, estetica e eticamente, por nos, mulheres e homens.”
O passo a ser dado, na perspectiva freireana, pressupoe riscos, porque o novo não
está dado, precisa ser construido, do projeto à execuçao. E isto assusta. A maioria das
pessoas prefere levar uma vida mediocre porque nao quer correr riscos. Prefere nadar a
favor da correnteza. Mas a construçao do novo, exige ousadia, criatividade. Exige romper
com praticas e costumes cristalizados. Paulo Freire dizia que a luta de classes é um dos
motores que move o mundo, mas não é o único. E ele reservou à capacidade de sonhar,
um motor fundamental na construçao historica de uma nova sociedade.
È dificil delimitar na obra de Paulo Freire, categorias teóricas puras. Mas podemos
destacar alguns valores e princípios pedagógicos. O principal deles é a “dialogicidade”,
porque para Freire, o dialogo é a matriz da democracia. O segundo é o trabalho coletivo e
o respeito ao conhecimento de-experiência-feito: “ninguem educa ninguem, ninguem se
educa sozinho; as pessoas se educam entre si, mediatizadas pelo mundo”. E ainda,
podemos acrescentar: a ética, a tolerancia, a politica, a esperança, a indignaçao e a
autonomia. Todos esses principios constituem “tijolos” na construçao do protagonismo e
da emancipaçao popular e nao podem ser pensados isoladamente, mas de forma
integrada, totalizante. Esses principios nos permitem olhar a vida e as potencialidades
humanas em todas as suas dimensoes.
O capitalismo nos dividiu, nos fragmentou. Temos que reaprender a nos
construirmos por inteiro. E para isso è preciso que ações concretas sejam realizadas e um
conjunto de atividades sejam colocadas à disposiçao das novas gerações para que elas
percebam que o caminho não é único. E que nao existe apenas um jeito de caminhar.
Mas que novos caminhos se fazem ao andar. E podem ser muito mais prazerosos, podem
lhes dar muito mais sentido as suas vidas, do que o que a sociedade atual oferece.
No mundo de hoje, onde a midia tomou conta do imaginário popular, vendendo um
modo de vida que só beneficia o mercado; onde a ideologia do consumo e o
individualismo competitivo tornaram-se objetivos de vida; e o limite do sonho, constitui-se
naquilo que o dinheiro pode comprar, a pedagogia de Paulo Freire é de uma atualidade
impressionante. Faz-se urgente, mais do que nunca na história humana, um processo de
desvelamento da realidade, de desideologização do senso comum e da prática cotidiana.
A pedagogia de Paulo Freire é a pedagogia do amor.

Fonte: http://www.cefuria.org.br/doc/educpoppedpf.pdf